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MP lança guia de apoio funcional sobre atenção em saúde mental de crianças e adolescentes
Um 'Guia de apoio funcional para garantia da atenção em saúde mental das crianças e adolescentes em uso abusivo de substâncias psicoativas' foi lançado pelo Ministério Público estadual nesta quinta-feira, dia 30, durante a última jornada do 'I Fórum Interdisciplinar em Saúde Mental’, que debateu o tema ‘Sofrimento psíquico e transtorno mental: Estratégias para enfrentamento na pandemia e no cuidado com a criança e o adolescente’. O evento contou com as palestras dos psiquiatras Ivan de Souza Araújo e Ivete Maria Santos Oliveira.
"O guia tem a intenção de orientar. Trata-se de um material de fácil acesso para auxiliar os promotores de Justiça a entenderem a responsabilidade de cada ente na atenção à saúde mental de crianças e adolescentes. Nosso objetivo é cada vez mais aprimorarmos nossos conhecimentos na área de saúde mental e entender bem como funcionam os serviços de atendimento aos jovens em sofrimento psíquico, para que possamos cumprir nossa missão constitucional de garantir os direitos dessa população”, explicou a promotora de Justiça Márcia Rabelo, coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Criança e do Adolescente (Caoca).
Márcia Rabelo fez a abertura da jornada, com os promotores de Justiça Tiago Quadros, coordenador do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional (Ceaf); Edvaldo Vivas, coordenador do Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos (CAODH); e Patrícia Kathy Medrado, coordenadora do Centro de Apoio Operacional da Saúde (Cesau). O evento contou ainda com a mediação dos promotores de Justiça Carlos Martheo e Leila Adriana Vieira Seijo de Figueiredo, coordenadora do Centro de Apoio às Promotorias Cíveis, Fundações e Eleitoral (Caocife).
O psiquiatra Ivan de Souza, que é especialista em psiquiatria da infância e adolescência, destacou a importância de se pensar estratégias para uma atuação precoce que evite o adoecimento e internamento dos jovens. “Temos casos de crianças que chegam para atendimento com episódios de diarreia. Realizamos diversos exames e não detectamos nada fisicamente. Mas a criança já está tensionada e daí começa a ter quadros orgânicos. Por isso precisamos focar no cuidado”, afirmou.
Ele falou também sobre o panorama da saúde mental infanto-juvenil na pandemia, com o aumento dos casos de ansiedade e depressão, inclusive em crianças que não tinham um histórico e começaram a apresentar quadros de sofrimento mental. “Ainda tem os impactos provocados com a suspensão das aulas presenciais. Para além das questões acadêmicas, as crianças deixaram de receber os estímulos que a escola dá. E isso impactou na saúde mental delas”. Outro assunto abordado pelo psiquiatra foi o papel da mídia na fase em que as crianças são muito vulneráveis. Ele falou sobre o chamado ‘Efeito Werther’, no qual a cobertura sensacionalista afeta mais a população vulnerável, e o ‘Efeito Patageno’, no qual uma cobertura responsável e de enfrentamento positivo auxilia na prevenção ao suicídio e tem efeito protetor nas crianças e adolescentes.
Para a psiquiatra Ivete Maria Santos, que é professora do departamento de neurociência e saúde mental da Universidade Federal da Bahia (UFBa) e atuou cerca de 30 anos no sistema prisional, o distanciamento e o isolamento social provocou um impacto econômico nas famílias e um estresse psicológico causado pela intensidade da convivência. “Isso muitas vezes causou um aumento do consumo de álcool e outras drogas entre adolescentes”, afirmou. Ela falou sobre a violência doméstica infantil e o estado de vulnerabilidade em que muitas crianças se encontram em suas próprias casas. “O local onde ocorre a violência é muito importante. Se tiver ocorrido em seu domicílio é ainda mais preocupante, porque em tese a nossa casa é segura. A quem a criança irá recorrer e denunciar se quem cuida dela comete a violência?”, ressaltou.
Ela complementou que também é preocupante a subnotificação de casos de violência doméstica durante a pandemia e que a diminuição dos números não pode ser considerado como fator positivo. “O isolamento social diminuiu a possibilidade de que outras pessoas do convívio dessas crianças façam as denúncias necessárias”, ressaltou. Outro aspecto abordado pela psiquiatra foi a triste realidade das crianças envolvidas nas atividades do tráfico de drogas. “Quando estudei o tráfico vi muitas crianças que ocupavam a função do olheiro. Essas crianças vivem em completa vulnerabilidade, com uma infância mutilada e acabam reproduzindo a violência a que estão expostas”.
Sobre o Guia de Apoio Funcional
A primeira parte do ‘Guia de apoio funcional para garantia da atenção em saúde mental das crianças e adolescentes em uso abusivo de substâncias psicoativas’ fala sobre a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). A segunda parte fala sobre qual é a responsabilidade de cada ente do Poder Executivo na atenção em saúde mental a crianças e adolescentes em uso abusivo de substâncias psicoativas. Logo depois, o guia traz um capítulo dedicado à forma que a rede de proteção deve atuar em caso de uso abusivo de substâncias psicoativas e outro capítulo sobre como o Ministério Público deve proceder ao receber denúncias de crianças e adolescentes em uso abusivo dessas substâncias. O guia traz ainda um anexo com uma lista dos equipamentos importantes da Rede de Atenção Psicossocial.