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Curso no MP promove debate sobre estratégias para combater o trabalho infantil artístico no ambiente digital
A exposição excessiva da imagem de crianças e adolescentes com intuitos mercadológicos foi o foco do debate que aconteceu hoje, dia 13, no Ministério Público estadual, durante o segundo módulo do Curso de Capacitação na Defesa de Crianças e Adolescentes no Ambiente Digital, transmitido em videoconferência, por meio da plataforma Teams. “A ideia desse curso de capacitação vem de um plano estratégico do Centro de Apoio da Criança e do Adolescente (Caoca) de aperfeiçoar a atuação dos promotores de Justiça na defesa de direitos de crianças e adolescentes no ambiente digital”, salientou a coordenadora do Caoca, promotora de Justiça Márcia Rabello Sandes, que destacou o fato de que, atualmente, as crianças e adolescentes passam uma parte cada vez maior do seu tempo nos ambientes digitais, o que se intensificou com a pandemia. “Isso aumentou a nossa preocupação em estarmos nesses ambientes para desenvolvermos a nossa atuação e o nosso olhar de proteção também nas condutas praticadas neles”, salientou. “É preciso refletir sobre as características de uma relação de trabalho na internet, envolvendo crianças e adolescentes, para a partir daí traçarmos estratégias de atuação do MP na defesa das crianças e adolescentes que se encontram nessa situação”, afirmou a coordenadora do Caoca na abertura do curso, que teve como mediadoras as promotoras de Justiça Anna Karina Omena Vasconceos Senna e a procuradora do Trabalho do Ministério Público do Trabalho (MPT), Andréa de Sá Roriz Tannus Freitas.
A palestra do advogado e coordenador do programa Prioridade Absoluta do Instituto Alana, Pedro Affonso Hartung, tratou da exploração do trabalho infantil artístico em redes sociais, através do uso da sua imagem na internet com intuitos publicitários. De acordo com o professor, que é doutor em direito pela Universidade de São Paulo, essa produção artística pode ser entendida como o que as plataformas usualmente caracterizam como produção de conteúdo, sendo, na verdade, algo que explora a força de trabalho infantil, uma vez que demanda uma atuação caracterizada por habitualidade, pela tentativa de influência de condutas e mesmo pela monetização dessa atividade. “Não estamos falando de uma troca necessariamente por dinheiro. Mas também quando a criança ou o adolescente recebe algum tipo de recompensa pela sua atividade online”. Outros pontos salientados pelo professor doutor como caracterizadores de trabalho foram a necessidade de realização de determinado número de postagens por período, bem como a imposição de que o público usuário, no caso os seguidores da criança ou adolescente, sejam respondidos online. “Essa habitualidade é característica marcante e decisiva de qualquer relação laboral”, frisou Pedro Hartung.
O palestrante pontuou também a existência de uma orientação de performance da criança e adolescente em relação às expectativas externas. “Isso gera uma obrigatoriedade de que se atinja uma expectativa, o que descaracteriza a ideia de uma postagem livre, feita espontaneamente, explicitando a existência de uma intenção comercial bem definida e pré-determinada”. A condição de distinguir esses tipos de exposição da imagem da criança e do adolescente no ambiente digital é algo que precisa ser aprimorado para evitar abusos, salientou o palestrante. Pedro Hartung destacou ainda a necessidade de desconstruir o discurso que responsabiliza integralmente os pais pelo uso que seus filhos fazem da internet. “As pessoas jurídicas, as empresas que são donas e gerenciam o funcionamento dessas redes, têm claros objetivos comerciais e, portanto, podem e devem ser responsabilizadas também”, afirmou o professor, chamando atenção para o fato de que o uso dos sites e aplicativos onde essas crianças atuam como influenciadores digitais não cobram nada pelo seu uso. “Um produto onde nada é cobrado para você deixa evidente uma questão de fundo muito mais deliciada: o verdadeiro produto é o próprio usuário”, afirmou, destacando a entrega de presentes às crianças que são influenciadoras com a expectativa de que estes sejam exibidos nas suas redes sociais de modo a influenciar o seu uso por outras crianças e adolescentes, o que “indubitavelmente caracteriza a própria natureza de um trabalho publicitário”. “Estamos numa sociedade hiperconectada e hiperconsumista, marcada também pela espetacularização. Nessa sociedade se promove e se vende o reconhecimento e o pertencimento”, concluiu o palestrante, apontando o raciocínio como indicativo de que os aplicativos que promovem esse processo são aplicativos de exploração comercial aos quais as crianças têm acesso.
Pela tarde, o curso seguiu com uma oficina prática, conduzida pela procuradora do Trabalho Ana Elisa Alves Brito Saggati, que buscou oferecer respostas a questões elaboradas pelo Grupo de Trabalho Infanto-juvenil (GTI) do Caoca, para que se proponham diretrizes consensuais sobre como atuar diante dessas demandas. Ao final do curso, que ainda terá um terceiro módulo no dia 20 de setembro, com o promotor de Justiça do MP de São Paulo Rogério Sanches Cunha, abordando os crimes cibernéticos praticados contra a crianças e adolescentes, será elaborado pelo Caoca um material com peças e orientações aos promotores de Justiça para defesa de direitos de crianças e adolescentes no ambiente digital. “Esse kit que disponibilizaremos é um produto de construção coletiva, com a participação dos próprios colegas, inclusive convidados de outros MPs, bem como do MPT, o que acredito que será um grande ganho no aperfeiçoamento da nossa atuação funcional”, afirmou a coordenadora do Caoca, promotora de Justiça Márcia Rabello Sandes.
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